quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

"- foi uma noite e tanto, feito letra de tango".

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

com um canivete, rasgava as fibras do tronco retorcido da árvore e, no buraco feito, sussurava seus segredos. com um pouco de barro, cobria o buraco e ia embora, sabendo, só ele, que compartilhava com cada uma das árvores do imenso bosque, seus mais valorosos segredos e que estes, descansavam calmamente em suas sombras.

domingo, 31 de outubro de 2010

construía os mais belos castelos de areia só para ver o vai-e-vem das marés os levar para o fundo do mar.
murmurava poemas doces e fazia de seus braços, o mundo.
frederico márquez tinha em seu quarto um grande mural atrás da porta com 67 variados tipos de bigode. eles eram ordenados por tipo de engomadura, comprimento dos fios, coloração e versatilidade. todo dia de manhã, logo após colocar seu habitual traje social, ele selecionava, feliz, o melhor bigode para a ocasião.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

maurice era o perfume divino que enchia o salão de festas com seu fatal aroma doce hipnotizante. seu corpo, ao dançar, flutuava e, nas nuvens nas quais parecia residir, estava toda sua leveza, demonstrada por cada sílaba que soltava nos ouvidos alheios.
j. scott nascera do acorde grave, de uma grande tuba, que cortou o céu estrelado de nova orleans na madrugada de 25 de agosto do memorável ano de 1934. dono do mais longo sopro no trompete que se tinha conhecimento, era famoso por ouvir bandas que ainda sequer existiam.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

depois de quarenta e cinco anos, em meio a caixas e papéis antigos, maurice encontrou um bilhete de seu falecido esposo para ela que dizia: "nunca se esqueça, eu te amo".

terça-feira, 31 de agosto de 2010

o sr. frederico shiapinni detinha todo o monopólio no ramo da indústria de relógios do sul da itália. mesmo assim ele nunca chegava no horário.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

todas as tardes, na sala de música forrada pelo outrora invejável papel de parede violeta trazido da capital e que agora trazia em si o desgaste dos anos, assim como sua pele, esculpida pelo tempo, dona mercedez separava um charuto para seu marido, servia três xícaras de chá para suas vizinhas e tocava uma sonata alegre ao piano enquanto aguardava a chegada de todos eles, mortos na sangrenta batalha de la colina de las esperanzas em 1913.

sábado, 7 de agosto de 2010

a canção de ninar se infiltrava em suas orelhas em um caminho sem volta e o embalava para o sono em um processo próximo à mumificação. todos seus orgãos partiam para um estado de repouso absoluto, como se esvaíssem dele em uma experiência de quase-morte, deixando-o vazio, mera casca de um objeto oco, fina camada intransponível, puro local receptor do eco de si mesmo.

sexta-feira, 30 de julho de 2010

conectado à terra, era assim que o pequeno menino, de sangue misto, igual ao do príncipe do sangue que vai-e-volta, se sentia. o sertão pai e a terra mãe.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

e na esquina, um cão amargurado pela vida me contou todas as suas histórias de desgraças, desolação e azar enquanto acendia seu cachimbo de erva-forte.

domingo, 20 de junho de 2010

josé estrada levantava todos os dias às 7h, passava a navalha pela barba, arrumava-se em sua melhor roupa, ligava o toca-discos, colocava o velho vinil guardado ao pé da cama e em posição de sentido ouvia o hino do brasil no volume máximo. depois disso, saía para a batalha cotidiana.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

silêncio por aquele que vai, mas fica.
j. saramago
18/06/2010

quarta-feira, 9 de junho de 2010

maria, no auge de seus 07 anos, não entendia o porque tantas pessoas morriam de cólera. era, pra ela, tão mais fácil e bonito, se ao invés disso, as pessoas morressem de amor.
e debaixo da água, ele sussurou no ouvido dela todo seu amor, contando os pormenores de todos os dias que se passaram desde que a viu pela primeira vez, no último verão.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

giuliano sempre passava o café às 13h30. era o mesmo café amargo de sempre e, por mais sugestões que recebia de como amenizar seu forte gosto, ele continuava a passá-lo do mesmo jeito. talvez o amargo do café fosse apenas um reflexo da pessoa que o fazia.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

carlos e suzete conversavam em frente à galeria de arte, quando no meio de sua fala, suzete foi atingida por uma merda de passarinho certeira. rapidamente puxou seu lenço vermelho e se apressou em limpar seu nariz sujo. porém, assim que terminou de se limpar, outras três pequenas bostinhas caíram em seu cabelo. antes que pudesse esboçar uma reação, suzete começou a ser bombardeada por uma verdadeira chuva torrencial de merda de pássaros que a deixaram sem reação, limitando-se apenas a se espantar com a situação, imóvel. após cerca de 3 minutos e finalizado o bombardeio áreo, carlos, que observava a cena atentamente e, acima de tudo, ileso e limpo, se limitou a dizer, complacente: 'que merda, hein?".

terça-feira, 13 de abril de 2010

pirata por nascimento, em suas veias corria o mar.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

aquelas lágrimas quentes, escorridas por mero descuido do olhar timidamente escondido, desejavam dizer, ardentemente,
apaixonadamente, esperançosamente, não se vá.

terça-feira, 30 de março de 2010

toda sua plantação de arroz era regada por lágrimas diárias, fossem essas de dor ou alegria, que caiam a cada passo que dava. talvez fosse esse o segredo de seu sucesso.

sábado, 27 de março de 2010

naquele sábado completavam 03 longos anos que juan estava em seu apartamento sem qualquer tipo de contato com o mundo. antes que pensem que era um exílio forçado, desfaço o engano desde já, era o contrário, juan optou pelo auto-exílio quando, desprovido de motivações para encarar a vida com alegria, decidiu que seria a melhor companhia para si mesmo.

não havia quase nada de especial para um longo relato desses 03 anos. juan assistira a todas as transmissões televisivas possíveis sem interrupção, completou 34.045 palavras cruzadas que eram passadas por debaixo da porta pela síndica e escreveu 2.302 haicais. fora isso, há de se destacar 3 fatos curiosos.

a) todos os dias, ele escrevia mensagens de esperança em pequenos pedaços de papéis e com os mesmos, fazia pequenos aviõezinhos e os lançava por uma fresta da janela do alto do prédio. não sabia se ele mesmo acreditava nelas, mas o simples fato de alguém se agarrar àquelas palavras com um afinco tão determinante, já o satisfaziam.

b) contando quase 1.000 dias em sua casa, juan sequer tivera chance de comprar lâminas para fazer sua barba. esta, acastanhada, cresceu impressionantemente durante esse tempo e passou a tomar conta de todo o apartamento. primeiramente avançou pelo chão atingindo sala, cozinha, banheiros e lavanderia. aos poucos, sem ter mais lugar para se espalhar, passaram a subir pelas paredes e assim cobrir todos os azulejos brancos que enfeitavam o harmonioso conjunto habitável. já no terceiro ano de reclusão, essa mesma barba passou a ultrapassar fronteiras, ora escapando pelas frestas das portas ou das janelas, e assim atingindo outros apartamentos e assustando seus moradores desavisados, que com pequenas tesouras, cortavam suas pontas como se fossem raízes que vinham buscar um local onde pudessem se fixar.

c) fora descoberto por um jovem repórter que viera investigar o mistério dos fios de cabelo que começavam a dominar o prédio. cedeu uma entrevista curta, sem nem sequer abrir a porta, apenas trocando bilhetes por debaixo dela, e em menos de 15 minutos após a publicação da reportagem, seu prédio se transformou em uma verdadeira meca. pessoas de todo o mundo, até mesmo coreanos ou vietnamitas, vinham ao encontro daquele que seria um novo messias. em questão de horas, a rua foi fechada e o fanatismo cresceu espantosamente.

por ser uma pessoa que apenas queria o silêncio e a vida calma, juan roeu os fios de barba próximos ao queixo, correu até a prateleira da cozinha com dificuldade para se locomover entre os fios e de lá arrancou uma grande cartolina, na qual escreveu a seguinte mensagem: "é tarde, é tarde que arde". feito isso, dobrou suas pontas a fim de transformar toda aquela quantidade gorda de celulose em um avião gigante, chutou com as pernas raquíticas a janela, fazendo os cacos de vidro caírem longos metros abaixo, segurou firme nas asas do avião recém-adquirido e saltou.

uma forte corrente de ar veio ressaltar que juan era uma pessoa de sorte e de tão forte que era, fez com que o avião voasse alto e para longe. no horizonte, juan foi se tornando um pequeno pontinho e depois de alguns minutos, rindo, sumiu de forma que ninguém nunca mais ouviu, viu ou sentiu juan outra vez em vida.

sexta-feira, 19 de março de 2010

pedaço
de aço
sem laço
nem baço.

domingo, 14 de março de 2010

gostava de acordar cedo, quando todos ainda dormiam silenciosamente e começavam a se despedir do universo onírico cotidiano, e assim apreciar a imersão no silêncio e no vazio das ruas, que deixavam a leve impressão que o mundo era dele, somente dele, mesmo que por apenas alguns instantes...

terça-feira, 2 de março de 2010

álvares havia sido alvejado
com 4 balas mortais
que saíram pela culatra.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

esse é o que ficou faltando
pra preencher o vazio do silêncio
do mês que perdeu seus dias
e nem se deu conta.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

monarquia.

e guardo em mim o último enquadramento que meus olhos fizeram daquela sala, já tão diferente dos dias passados, tão rotineiros, mas ao mesmo tempo tão bonitos em sua simplicidade. e sei que vou sentir muita saudade do lugar que acostumei a chamar de minha casa.

nunca.

pedro nunca furava fila. pedro nunca pegava o carro de sopetão e saía com os amigos. pedro nunca deixava a segurança da sua casa e se lançava numa viagem de última hora. pedro nunca arriscava uma dança debaixo da chuva. pedro nunca comia algo diferente em seus almoços diários. pedro nunca via filmes que fugissem do seu gosto. pedro nunca cancelava compromissos pra fazer algo inusitado. pedro nunca saía de casa sem guarda-chuva. pedro nunca pegava caminhos alternativos pra voltar do trabalho. pedro nunca arriscava seu dinheiro na loteria. pedro nunca falava calorosamente seus argumentos em discussões. pedro nunca assumia dívidas. pedro nunca vivia. pedro nunca, rg. 274.677.915-2.

domingo, 17 de janeiro de 2010

percorreu toda a ótica olhando atentamente, através dos finos vidros, cada um dos modelos que estavam expostos. claro que não podia deixar de notar todos os anúncios com os modelos exibindo um largo sorriso no rosto ao colocarem belos óculos escuros, muitos dos quais ele achava de péssimo gosto.

depois de muito andar de um lado para outro, experimentar diversos modelos, seu avô, ao contrário do que era esperado, sorria ao observá-lo, tão pequeno em frente às grandes vitrines imponentes. porém, foi em frente à uma menor, no canto da loja, que ele finalmente escolheu o modelo. pareciam feitos um para o outro e através dele, mesmo com seus apenas 9 anos, sabia que veria os fatos de uma maneira diferente. abriu um largo sorriso e pediu para a atendente, mesmo não enxergando muito bem toda a extensão de seu corpo, com muita determinação, o terceiro óculos da quarta prateleira, um óculos 3D.

sábado, 9 de janeiro de 2010

o primeiro desenho do caderno.

"ele tinha uma imaginação muito fértil"
ps. o risco é a troca de folhas do caderno, o que também é sempre um risco.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

jaime era um caso raro na medicina moderna. ele andava sob observação, pois em seu último tombo pela rua, testemunhas afirmam que suas memórias rolaram e se perderam pelo asfalto. elas foram rolando, rolando, rolando, e viraram a esquina, desaparecendo.
eu consigo ficar cansado antes mesmo de fazer o que me comprometi a fazer. fico nesse balanço tooodo, cansado e espreguiçando. rolou a maior preguiça de fazer um post.

domingo, 3 de janeiro de 2010

o cobertor todo enrolado pelo corpo e tudo que se ouvia era um francês suave que dizia, je t'aime, je t'aime beaucoup. entre as lacunas e barreiras da língua, cristina sentia o amor.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

e ela me disse, firme nos meus olhos: eu te vi nascer, bandido!